Senhoras e mulheres

Senhoras e mulheres,

Começou em Berlim o Congresso Internacional da Liga daquelas mulheres que lutam pelos direitos das mulheres. Seria mais conveniente chamar esse Congresso de congresso de senhoras pois predominam claramente as representantes do belo sexo da burguesia, no máximo, da pequena burguesia.

Mulheres do povo trabalhador não participam de jeito nenhum. Não porque não tenha­m consciência política. Pelo contrário, as mulheres conscientes, que participam ativamente na vida política e na luta política, as mulheres com convicção socialista, evitam decididamente esse encontro e essa pretensa liga das mulheres porque não querem ter nada em comum com as senhoras e suas aspirações.

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O que querem essas mulherzinhas reunidas em Berlim e que caráter têm suas aspirações? O movimento feminista no sentido de busca pela igualdade política entre mulheres e homens é já mais antigo e começou, sobretudo, na América. Isso foi no tempo em que a escravidão dominava nos estados do sul da América, de modo que as mulheres americanas que lutavam por seus direitos juntavam sua causa com a causa da libertação dos escravos. Corajosamente, elas entravam com a palavra oral e escrita em prol da abolição da escravidão abjeta, de modo que, quando em 1861, depois da guerra, a escravidão foi proibida na América e, quando, em 1888, o primeiro Congresso Internacional de Mulheres se realizou em Washington, ao lado da presidente [do Congresso] já bem idosa – uma lutadora pela igualdade dos direitos das mulheres – um escravo liberto falou com insistência em favor dessa igualdade.[1] Naquela época, o movimento feminista na América era permeado pela convicção de que a causa das mulheres estava estreitamente ligada à questão da mudança social em geral, de que a mulher não devia lutar apenas por seus próprios direitos e liberdade, mas também pela igualdade e fraternidade entre todos os seres humanos, pela abolição de toda desigualdade e de toda injustiça social.

Na Europa, na velha Europa burguesa, nunca o movimento feminista adquiriu caráter tão profundo e significativo. Ele foi desde o início exclusivamente um movimento das defensoras da “emancipação das mulheres”, isto é, daquelas estranhas mulheres burguesas que não conseguem compreender minimamente a conexão entre a situação das mulheres na sociedade atual e as condições sociais gerais. Para essas defensoras da “emancipação das mulheres”, o acesso das mulheres às Universidades, andar de bicicleta, a obtenção do direito de voto das mulheres para os parlamentos, ensinar floricultura e trabalhos manuais às meninas, debater sobre o melhor modo de educar as crianças, usar roupas confortáveis etc. tinham e continuam tendo a mesma importância. A senhora burguesa entediada, cansada de seu papel de boneca ou de cozinheira do marido, corre, caprichosa, para todos os lados, em busca do espetáculo que preencha o vazio de sua vida e de sua mente.

Por isso não é surpresa que, apesar do poderoso grito de combate lançado pelas mulherzinhas reunidas em Berlim, ninguém as leve a sério. Elas são visitadas tanto pelo sorridente chanceler Bülow, que recentemente insultou as jovens estudantes russas em Berlim, quanto pela esposa do imperador, conhecida por sua devoção à Igreja, e pelo ministro Conde Posadowsky, esse notório reacionário. E a imprensa burguesa descreve com grande pompa tanto os movimentos como também a aparência dessas senhoras. Elas proclamam bem alto o princípio da igualdade política entre mulher e homem, um princípio cuja realização significaria pôr a ordem burguesa de ponta-cabeça, ou seja, derrubá-la, mas a burguesia se curva gentilmente diante das senhoras barulhentas, pois sabe muito bem qual é o jogo de todo esse movimento de mulheres.

A mulher consciente do povo trabalhador observa com a devida seriedade e um sorriso desdenhoso esse “Congresso das mulheres”. Para ela está claro que, enquanto a burguesia dominar, a igualdade de direitos entre mulher e homem é uma quimera. O capitalismo introduziu faz tempo, para as mulheres proletárias, a igualdade de direitos na miséria, no trabalho, na exploração. A trabalhadora da cidade e do campo não precisa primeiro andar de bicicleta, de qualquer modo ela não pode frequentar a universidade, para alcançar alguma igualdade de direitos com o homem. No sofrimento da labuta pelo pão quotidiano para si e seus filhos, ela se equipara ao seu companheiro. A causa do proletariado lutando para melhorar sua existência tornou-se sua causa. Hoje a mulher do povo trabalhador só pode encontrar o caminho da sua emancipação no movimento sindical e no movimento socialista. E só o movimento socialista pode levar a igualdade de direitos a todo o mundo das mulheres. Assim que a classe trabalhadora vitoriosa tiver eliminado a exploração e a repressão dos seres humanos por outros seres humanos, também a longa dominação do sexo masculino sobre o da mulher chegará ao fim. A emancipação das mulheres não começa nos “Congressos de mulheres”, recebidos no mundo burguês com um sorriso indulgente e depreciativo, mas nos congressos de trabalhadores socialistas que os ministros, chanceleres e a imprensa burguesa olham com ódio sombrio escondido no coração.

Gazeta Ludowa, no 48, 16 de junho de 1904, p.1

Tradução: Isabel Loureiro

[1] Elisabeth Cady Stanton e Frederick Douglass (nota de Holger Politt).

Foto: Congresso SPD_SET 1905 Jena / Editora Dietz – Fundação Rosa