Vinte e cinco anos da Festa de Maio (1914)

Publicado no boletim Sozialdemokratische Korrespondenz (1913-1915), fundado por Rosa, Mehring e Marchlewski visando a difundir as ideias da oposição de esquerda no SPD. Neste artigo de celebração do dia do trabalhador, Rosa faz um resumo da conjuntura europeia dos últimos 25 anos, chamando a atenção para dois fenômenos novos: o desenvolvimento do progresso técnico que é, ao mesmo tempo, uma nova escravidão para os trabalhadores e o imperialismo.


Um quarto de século, na vida dos povos, é como um segundo na vida dos homens. E, no entanto, que reviravolta imensa, quando observamos os vinte e cinco anos que se passaram desde que existe a Festa de Maio internacional!

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Quando, em 1890, pela primeira vez se inauguraram os laços da nova Internacional por meio da chamada Festa de Maio, os exércitos social-democratas espalhados por toda parte eram a imagem de um punhado pequeno e frágil. Os partidos de trabalhadores dos principais países haviam sido fundados havia alguns anos, e a sua vanguarda, a social-democracia alemã, acabara de vencer, com êxito, a prova de resistência de onze anos de uma legislação de exceção, as leis antissocialistas. Hoje, o partido social-democrata alemão e os sindicatos do país também contam milhões de membros, e em todos os países capitalistas partidos fortemente organizados e sindicatos respeitáveis se encontram à frente do proletariado em luta. Enquanto, na época, só pequenos postos avançados representavam a social-democracia nos parlamentos, desde então ela desenvolveu uma grandiosa ação parlamentar, tendo penetrado, em todos os países, nos corpos legislativos, do parlamento central aos conselhos comunitários. Nesses vinte e cinco anos, a imprensa socialista se tornou um poder forte e surgiu o trabalho de formação sistemático da social-democracia, bem como o movimento proletário da juventude.

No entanto, essa constante ascensão da classe trabalhadora não passa de um reflexo das profundas transformações no seio da própria sociedade burguesa.

A produção capitalista e a industrialização do mundo avançaram a passos gigantescos ao longo do último quarto de século. O progresso técnico em todas as áreas, principalmente na eletrotécnica, na indústria química e na conquista do espaço aéreo, teve um florescimento nunca imaginado. Ao mesmo tempo, a concentração do capital, o sistema industrial, a ampliação dos cartéis e trustes, o crescimento do capital bancário concentrado e sua influência internacional potencializaram ao máximo o predomínio da classe dominante exploradora.

Na área política, os mesmos vinte e cinco anos estão sob o signo de uma nova aparição: o imperialismo. Enquanto, no final dos anos 1880, a pequena Europa ainda era o palco real da diplomacia internacional com suas contabilidades dos tempos da trisavó e seus meios e truques antiquados, agora é o mundo inteiro com os cinco continentes e três oceanos em que o capital internacional posiciona suas minas assassinas, prepara seus quadrantes de tempestades e atiça seus cavaleiros do apocalipse das revoluções e guerras mundiais sangrentas. Desde então, numa rápida sequência de estrondosas trovoadas, as guerras sino-japonesa, hispano-americana, sul-africana, sino-europeia, russo-japonesa, de Trípoli e dos Bálcãs, as revoluções russa, persa, turca e chinesa bateram nos velhos muros e nas velhas trincheiras, transformaram a antiga ordem de milênios em escombros fumegantes para, na mesma respiração quente, anunciar a dominação mundial do capital e o seu fim próximo.

Para as massas trabalhadoras, essa transição trouxe apenas mais miséria, mais pressão e uma nova escravidão. Para elas, a industrialização do mundo se tornou sinônimo de proletarização de milhões e mais milhões de pessoas. O progresso técnico se tornou o flagelo do trabalho mais intensivo, que chicoteia, sem piedade, músculos, cérebro e sangue do proletário, lançando-o ao túmulo com cruel velocidade. As fortalezas do capital concentrado, os cartéis e as associações empresariais, introduziram uma era de locautes em massa e uma guerra interminável contra as coalizões dos trabalhadores. O surgimento do imperialismo impôs a eles a carga terrível do armamento militar. Enquanto, finalmente, há vinte e cinco anos houve um longo período de queda de preços no mercado mundial e a chamada crise agrária, ou seja, alimentos baratos, foi objeto da choradeira geral da classe dos capitalistas, desde então houve uma brusca mudança rumo a uma inflação crescente cujo fim não se enxerga ainda.

Assim, em meio ao emaranhado confuso de contradições agudas, abalos violentos, lutas acirradas, o último quarto de século de desenvolvimento capitalista contém uma precisa confirmação, uma personificação viva de todas as conclusões e esperanças e de todos os anseios em que se fundamenta a luta de classes socialista do proletariado. Atrás de nós há um período da história em que cada passo ficou marcado com ferro em brasa e com incontáveis dores nas nucas das massas proletárias, um período em que, ao mesmo tempo, cada avanço anuncia com vigor a essas massas que a ordem social capitalista está correndo célere rumo ao seu colapso e que a libertação socialista da classe trabalhadora só poderá ser obra dessa mesma classe trabalhadora.

Durante todo esse tempo, a Festa de Maio – o Dia do Trabalhador – marcou a pulsação da luta trabalhadora. Em 1890, inaugurou a nova Internacional, a união dos trabalhadores de todos os países, colocando antecipadamente a fase do imperialismo em oposição à ação de resistência conjunta do proletariado mundial. Na Áustria, deu o sinal para a luta pelo sufrágio universal. Na Rússia, em um primeiro momento, foi uma mensagem sussurrada secretamente em pequenos círculos, para depois brilhar no ano da Revolução, 1905, em uma marcha triunfal pelas ruas de Varsóvia para depois, em 1911, pela paralisação do trabalho de meio milhão em São Petersburgo e outras cidades anunciar o novo despertar do proletariado russo da rigidez plúmbea da contrarrevolução. Em torno da Festa de Maio derramou-se o sangue dos proletários franceses em Fourmies e Carmaux e dos poloneses, em Varsóvia e Łódź. Em toda parte, foi o primeiro grito de uma camada trabalhadora prestes a ir ao combate e a onda máxima de uma atmosfera revolucionária.

Hoje, as duas principais bandeiras da Festa de Maio – a jornada de oito horas e a paz mundial – a cada dia se tornam mais urgentes e vivazes face à pressão cada vez mais insuportável da exploração e das orgias selvagens do militarismo.

Qual foi, porém, o balanço geral das experiências dos últimos vinte e cinco anos para a nossa luta? Qual é a nossa tarefa especial na situação atual? É saber que somente ações proletárias de massa em todo o seu vigor e todo o seu poder são capazes de continuar apoiando e ampliando a nossa ação parlamentar. Que, nos grandes momentos decisivos da luta parlamentar e sindical, da política tanto interna quanto internacional, só mesmo a pressão máxima daquelas ações em massa, a paralisação do trabalho é capaz de conduzir a causa proletária até a vitória.

É o espírito da Festa de Maio, é a ideia da pressão da massa de braços cruzados, da qual nasceu a Festa de Maio, o que hoje, cada vez mais, domina o modo de lutar do proletariado internacional.

Por isso, a Festa de Maio continua viva hoje, depois de vinte e cinco anos, mais do que nunca. Por isso, ela sobreviverá a todos os momentos inevitáveis de desânimo na ascensão histórica do proletariado. Ela continua sendo o mensageiro flamejante da luta de classes revolucionária. Ela continua sendo o arco-íris sobre toda a confraternização proletária mundial, através de cujo portal reluzente encontra o grande exército dos explorados e oprimidos para uma ordem social melhor.

Sozialdemokratische Korrespondenz (Berlim), nº 47, de 27 de abril de 1914

Tradução: Kristina Michahelles

* Publicado em Rosa Luxemburgo, Gesammelte Werke 3, Berlim, Dietz, 1984, p.435-38. Rosa Luxemburgo se refere ao Dia do Trabalhador.